segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Uma dose de Balzac...

Não perdi as ilusões, porque nunca as tive. Mas as certezas, que eram tão poucas e que eu tinha tão concretas... ah! Por que ralo escorreram, que eu não consigo mais encontrar?



L.

domingo, 21 de outubro de 2007

A flor branca...

Uma flor branca sobre uma mesa de mármore.

A menina a olhou. Olhou fixamente e nunca pensou que poderia lhe pertencer.

É linda.

Ela pensou.

E por mais que tenha pensado que não, sim, aquela flor lhe pertencia. E quem lhe tinha ofertado achava que aquela menina, prestes a se tornar uma mulher interessante, era uma rainha.

“É sua.” Falou a amiga.

“Minha?” Indagou, quase não acreditando, a menina.

“Minha!”

E essa menina, mal sabia, que ao aceitar a rosa estava entrelaçada eternamente com a história desse moço. Sim, o moço da rosa branca.

Eles se amaram e se desejaram sem o saber.

Pensaram um no outro.

E finalmente se encontraram.

E dançaram. Beijaram um ao outro.

Conversaram com olhares.

Eles se viram todos os dias.

E brigaram. E cantaram. E foram sendo felizes.

Ela partiu.

Eles choraram.

E a intensidade da beleza daquela rosa branca, lá do começo da história desses dois, fez com que o amor aumentasse. O amor virou satisfação de estar junto. Mesmo não estando.

O amor transformou, fez conhecer, fez indagar, fez dos momentos e dos lugares coisas inexplicáveis.

O amor é inexplicável.

Mas seria só amor? Não, não.

Eles se reencontravam. E não se viam. E se reencontravam. E não se achavam.

E até chegaram a pensar “não dá mais.”

Aí o moço partiu.

Foi além-mar.

Ela sofreu.

Chorou, chorou, chorou.

Ele também.

Chorou, chorou, chorou.

E ela ainda chora.

Ainda sente o cheiro repentino. Uma saudade que passa-e-não-passa.

Aí ela se lembra daquela flor lá do começo.

E lembra que ao aceitá-la entrelaçou sua vida eternamente a do moço.

Ela sorri. Um meio sorriso, de uma meia felicidade.

E ele?

Ele também sorri. Um meio sorriso, apesar de sempre largo, mas um sorriso de uma meia felicidade.

A flor...

É todo dia nela que a menina pensa...

Forma bonita de pensar no moço.

Forma bonita de tê-lo um pouco menos distante...



*uma história real



I.

domingo, 14 de outubro de 2007

Dialética

Acordo.

A chuva cai e é estranho.

Aqui nunca chove.

A cabeça roda e dói, e não é uma ressaca.

Olho pra sacolinha de um supermercado. Lá diz “não ao desperdício”.

E acho mais estranho.

Eles querem nos dar dicas, mas esquecem que aquelas sacolinhas são tão prejudicais à nossa vida quanto o desperdício de água.

Humanos.

Somos assim.

Dialéticos.


I.

terça-feira, 2 de outubro de 2007

Dia nublado

Acordo cedo e olho pela janela da sala. Vejo o horizonte todo esbranquiçado. Na verdade vejo não muito longe, tudo meio branco e meio denso, os topos dos prédios baixos cobertos pelo nevoeiro, e o sol escondidinho atrás das nuvens. O horizonte? O horizonte eu nem vejo. Eu posso simular um sorriso e dizer mentalmente "Oba, neblina!" Até tento. Mas os 34°C e o cheiro de fumaça não deixam. E cadê as gotinhas d'água que deveriam cobrir as folhas das árvores, como em toda cerração matinal?

Dia cinza, ar seco, e termômetros em disparada. O ar raleia um pouco ao longo da manhã. Parece menos cinza, e o sol um pouco mais brilhante. Subo no ônibus ao meio-dia e não encontro um lugar pra sentar. Fico de pé, de frente para a janela dos fundos, olhando a rua correr debaixo dos meus pés. A fumaça que sai dos carros se mistura à fumaça do ar, e à fumaça do cigarro nos dedos do velho no ponto de ônibus, e à fumaça da casa que eu vi queimar há três dias, e à fumaça do fogo que risca o morro de Santo Antonio há semanas, tantas que eu não consigo me lembrar.

O ar entra pelas narinas secando tudo, até os pulmões. Os faróis andam à meia-luz, no meio da fumaça do meio-dia. O dia está cinza, o céu enfumaçado, o sol apagado, e o ar tão quente e denso como eu nunca vi. Se eu filmasse esse dia, e alguém de longe pudesse assistir, esse alguém me perguntaria por que as pessoas não estão agasalhadas, ou com guarda-chuvas, em um dia tão nublado, no meio de tanta névoa, com cara de que vai chover. E a moça do tempo anuncia: "Previsão de chuvas em Cuiabá a partir do dia 15 de outubro." Quinze! E o termômetro da avenida me informa: meio-dia e um, 41ºC.

Ao meio-dia e meia já estou resguardada no conforto do ar-condicionado, recebendo as boas notícias que eu já sabia que viriam, e pensando em toda aquela fumaça lá fora.

Acendo um cigarro e dou a minha contribuição ao dia nublado que me consome. Penso na fumaça, nas boas novas, na fumaça...



L.